quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Problema com BIS, solução moral

Durante a aula na Segunda série D deparei-me com um dilema chocolático (se é que existe essa palavra) para solucionar. Após verificar as respostas que mais aproximaram-se do que haveria dentro da caixa preta, notei que quatro grupos estavam em pé de igualdade para a solução. Como vi que já que ia premiar os quatro, mais fácil seria já premiar a sala toda por ter ajudado no desenvolvimento da aula e também para passar uma idéia de generosidade e divisão com nossos iguais e foi a decisão que tomei.

Ao comunicar a decisão a classe, alguns alunos levantaram a questão: essa solução é injusta. Seria, pois, injusto dividir o prêmio com toda a sala, sendo que apenas alguns chegaram próximos do que havia no interior da caixa.

E antes de responder me detive um momento em pensamentos me perguntando... injusta para quem? Afinal, qual a perspectiva dessa injustiça?

E então irrompeu em mim uma vontade de falar sobre o assunto e foi inevitável acabar dando uma solução moral a sala.

Claro que quem sou eu para impor qualquer prática de aspecto moral, que deve nascer de dentro da alma individual de cada um e não ser imposta, então comecei dizendo que o que ia dizer era mais para pensarem, não para responderem, porque segundo diferentes perspectivas, obteríamos diferentes soluções para o caso, e claro, não há a solução correta e a errada, apenas há a solução que privilegeia mais uma atitude competitiva e de desigualdade social e aquela que opta pela igualdade social e a cooperação.

O caso foi metaforizado em outro: Existe um cara, muito rico e com muito dinheiro, e dono de muitas terras e fazendas, todas produtivas e que lhe dão muito dinheiro, dinheiro pelo qual ele trabalha para manter e cada vez mais multiplicá-lo... ao lado de suas terras há um assentamento de sem-terras, onde vivem na miséria, pobreza e desnutrição, com as crianças passando fome, anêmicas e doentes, é justo esse tipo de situação? É justo que uns se vangloriem com muito, e outros morram famintos as pencas pelo mundo... afinal, onde há a justiça?

Mas por outro lado, seria justo para o dono das terras, que as conquistou com trabalho e suor e reuniu toda sua vasta riqueza ao longo de vários anos, desapropriar uma de suas propriedades e dividi-la entre os sem terras distribuindo também parte de sua renda de uma forma mais igualitária, para que ao menos todos pudessem ter uma vida digna, saudável e sem escassez e miséria? E dessa forma ficando o dono das terras privado e tendo subtraído parte de seus lucros e riquezas que seriam dados para outros que não teriam feito o mínimo de esforço para conseguir o que ganhavam.



O problema dessa solução, que a princípio tão trivial, afinal, era apenas um bis branco... tornou-se então uma representação do problema que nós enfrentamos todos os dias na nossa vida, tornou-se um modelo da lendária disputa entre dois sistemas econômicos antagônicos e com bases em preceitos muito distintos.

Nosso atual sistema econômico, o capitalista, aquele no qual vivemos, diria que é justo que aquele que lutou, competiu e venceu, seja o único a ter acesso, usufruir e gozar de suas riquezas, fortunas e glórias. Em algum outro sistema mais igualitário, que poderiam ser o socialismo, o comunismo ou mesmo o anarquismo... o justo seria que o prêmio fosse distribuído igualmente, ou proporcionalmente entre todos, e mesmo que de forma desigual, mas que ao menos garantisse o básico de acesso de todos a condições humanitárias de existência, alimentação, saúde, trabalho e educação, mesmo que isso significasse ter que retirar de um, que tem em excesso, para dar a outros que não trabalharam e venceram a árdua competição do cotidiano.

As duas justiças poderiam estar corretas, eu optei por algo mais generoso e igualitário, por dois motivos, primeiro pelo meu caráter que inclina-se mais para esse lado, e segundo, pois é uma forma de mostrar que grandes temas perpassam pequenas situações de nossa vida, e mais do que ganhar um bis, estaria dando a todos uma chance de poderem também rever suas posições quando a solução chegassem a suas mãos.

Talvez não fosse a melhor solução, ainda mais porque, pelas leis de nosso país, a solução correta teria sido premiar apenas os vencedores, porque não devemos esquecer que apesar das políticas assistencialistas do governo, também vivemos em um sistema capitalista, onde a motivação para tudo e inclusive a educação é encarada pela sociedade como um meio para um fim certo e almejado por todos, o dinheiro, a aquisição de mais recursos, a vitória na competição social que é viver no Brasil.

Espero não ter magoado ninguém na sala levantando essa discussão, o que posso dizer não foi minha intenção, e nem por impor a minha solução, que afinal foi a que tomei. Só digo que perdido não foi esse momento na aula, porque mesmo que a física não estivesse ali presente, a discussão sociedade-riquezas-atitudes, passou muitas e muitas vezes pelo mundo dos físicos os quais nem sempre fizeram as escolhas mais igualitárias na ocasião, haja visto, que alguém afinal, um físico, teve que aceitar construir a bomba de Hiroshima.

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